Avancei o dedo para tocar na face que me acusava, mas ela recuava, sempre e sempre. Me assustei quando, ao avan?ar o dedo, senti o toque em minha face.

  éfrera desceu suave e recolheu as asas, como um sinal de deferência. O grande anjo que se postava tranquilo à frente dos outros a examinou com cuidado, mostrando um interesse genuíno. Era muito raro os vigilantes procurarem os anjos.

  - Agrade?o atenderem ao meu pedido de um encontro – falou se aproximando da comitiva.

  à frente, na clareira, estavam sete anjos. Eles eram soberbos, as faces tranquilas e majestosas. Três das demianas que faziam parte da comitiva tinham o porte e o modo de guerreiras muito poderosas.

  Mas, ali estavam eles, em paz, os rostos amáveis e gentis.

  - Sabe, demiana, estou curioso – cumprimentou o que parecia ser o comandante, se destacando de vez do grupo. - Você, sendo uma vigilante, nos procurando. é algo muito... estranho, e devo confessar, gratificante.

  éfrera o examinou com interesse.

  Ele era alto, o corpo longilíneo e ágil, envergando um saiote grosso, uma camisa fechada e um gib?o branco do duro metal dos anjos, coisa rara de se ver. Com saudades se lembrava muito bem delas, como se sentia incrível quando as envergava. Com um suspiro voltou os olhos para os outros, e viu que estavam protegidos da mesma forma, todos envergando suas vestes alvas.

  - Confesso que os tenho em grande conta. A verdade é que n?o sou e nunca os tive como inimigos. Nada me move contra vocês. Ent?o, o que me impediria de ter com vocês?

  O anjo a observou atentamente.

  - Sabe que também somos caídos, n?o sabe?

  - Há quem duvide, quer dizer, que sejam caídos. Corre a vers?o de que alguns de vocês desceram por escolha. AsasLongas...

  - O que n?o aumenta ou diminui o que somos, porque estamos aqui, nesses lugares mais baixos.

  - Mas diz muito do que os move.

  - Vimos observando você, e devo dizer que suas atitudes se assemelham mais a um anjo que desceu por escolha – o anjo sorriu amável.

  - Eu sei sobre você. Medriel, é o nome com que desceu, estou certa? - reconheceu surpresa. – Miguel é como passou a se chamar...

  - Vejo que estudou um pouco. é um prazer conhecê-la, éfrera – cumprimentou com um enorme sorriso. – Ou?o muitas estórias sobre você, e devo confessar que gosto de ouvi-las. Ent?o, sabendo de seu valor, estou curioso para saber o que a inquieta. é sobre Mercator?

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  éfrera o observou, e ele deve ter notado seus olhos confusos.

  - Sim, é sobre ele. Eu estou curiosa...

  - Ah, ele realmente é um caso curioso.

  A demiana o observou mais atentamente.

  - O que ele é? O que ele representa? – perguntou, aceitando o convite do anjo para se sentarem na larga pedra. – Me disseram que a culpa da queda seria dele, por causa do arcanjo. Mas eu...

  - Você n?o acredita nisso, n?o é mesmo?

  - Ele me disse que ele mesmo caiu bem antes das quedas determinadas por Tup?. Eu procurei saber, e Mercator falou a verdade... Ele é da segunda era, da primeira guerra demoníaca, quando os homens nem mesmo eram pensados.

  - Ele é mais antigo que isso, como dem?nio, éfrera.

  - Eu entendi que deve ser assim. Quanto mais antigo?

  - Ele foi de uma das primeiras famílias de anjos tornadas conscientes pelo Trov?o. Ele estava lá, quando brincaram de criar a escurid?o... Vê, éfrera, Mercator é um livro de capa grossa. N?o é mesmo? Um livro escrito numa língua antiga, até mesma vencida. Na verdade, n?o sabemos muito dele, mas apenas que o Trov?o parece ter cuidado dele desde o início.

  - Mas, o arcanjo...

  - Ao que parece, enviado por ele.

  - Um marcador?

  - é o que parece...

  - E a flor azul, que tanto fascínio parece exercer nele, o que é? O que representa?

  O anjo sorriu, maravilhado.

  - Que bom que observou isso. A maioria ignora esse aspecto – parabenizou. – Esse, minha querida éfrera, é um outro marcador, muito mais poderoso, muito mais especial.

  éfrera ficou sem silêncio, pensando.

  - é o que penso que é? Um marcador de alma?

  - é isso mesmo.

  - Vocês o est?o estudando, o est?o seguindo, n?o é mesmo? – desconfiou surpresa, os olhos presos no rosto do anjo.

  - Damos nossa ajuda...

  - Aos planos do Trov?o?

  - Queremos acreditar que sim, mas mais ainda uma ajuda ao próprio Mercator.

  - E por que ajudariam um dem?nio como ele?

  - Sabe, éfrera, n?o existem, na verdade, anjos ou dem?nios, mas apenas centelhas do Trov?o. Nomes s?o apenas lan?ados para identificar as escolhas feitas que, por sua vez, refor?am e determinam os nomes que envergamos, e de novo as experiências que nos permitimos.

  - Havia me esquecido como gostam de enigmas – éfrera n?o pode deixar de sorrir. - Ent?o, Mercator... Dor?

  - é o que entendemos. Ele, ao que tudo indica, sentiu mais que os outros a separa??o do Trov?o.

  éfrera ficou em silêncio, os pensamentos correndo.

  > Medo, solid?o, sensa??o de ter sido traído, de se sentir justificado, dor... Diferente dos outros que se tornaram dem?nios, também pelo medo, Mercator carrega algo mais...

  - Amor... – suspirou éfrera. – Obrigado a vocês... – suspirou se levantando e elevando lentamente.

  - Estaremos sempre à distancia de um pedido – ouviu de Miguel com suavidade.

  Com um cumprimento éfrera deu um impulso suave com as asas e se afastou para uma caverna numa montanha distante, onde poderia pensar com calma.

  - Ela n?o sabe, n?o é mesmo? – perguntou uma das demianas se aproximando de Miguel, os olhos seguindo a vigilante que se perdia no azul do céu.

  - O que s?o nomes? – suspirou Miguel, os olhos também seguindo a vigilante, até que se tornou um ponto que se afastava como se pensasse, até que desapareceu.

  - No caso dela, destino – a demiana falou por fim, baixando os olhos para o rosto de Miguel. - O “azul enviado” diz muita coisa – reagiu a demiana com um largo sorriso. - Ela é um marcador muito mais poderoso que qualquer outro.

  - é sim – Miguel concordou. - E que bela alma tem esse marcador. Esse marcador n?o se corrompeu ou justificou sua escurid?o em seu abandono, apesar de toda a dor...